Ana Leme

Origem, de Anna Cunha (Maralto)

“Só existe um tempo: o tempo vivo.” Com as palavras de Bartolomeu Campos de Queirós, Ana Cunna nos presenteia no início de sua obra. Origem vem carregado de tempo, vida, infância, silêncios, brincadeiras, vazios tão cheios de tanto que abraçará o leitor mesmo depois que terminar o passar das páginas.

Somos tomados por uma inquietação logo na primeira frase. “No princípio era um grande sossego.” De que sossego estamos falando? Lendo os próximos versos, acreditamos ser do grande universo, mas Anna nos provoca um pouco mais: “Nesse tempo longe, esquecido, sempre de novo a primeira vez, os meninos eram descalços. Plantados na sombra de uma árvore.” A Criança chega brincante, só ela, seu corpo, seu tempo, seguindo seu destino. Esse menino que riscava a terra fará você leitor, buscar o seu menino, seu tempo, a sombras de árvores que protegiam o seu brincar. Nós, leitores adultos sentiremos vontade de brincar, de deixar o corpo dançar na leveza dos silêncios que antecedem o criar, os segundos que antecedem ao gesto.

Com uma beleza desconcertante, as imagens convidam as palavras a uma dança poética rica em simplicidade e força.

Em 2022, Origem ganha Prêmio Jabuti – na categoria Ilustração, publicado pela Maralto Edições é realmente um presente para nós leitores.

Achou?, de Aline Abreu (Companhia das Letrinhas)

“Achou?” chega para os leitores carregado de liberdade e afeto. Um convite para que os olhos, os dedos e as conexões sigam os desejos de cada leitor.

Com uma técnica de ilustrar muito característica da Aline Abreu, vemos uma dança poética entre texto e imagens com texturas, de maneira que somente os olhos não dão conta desta leitura. Logo, os dedos do leitor passeiam pelas imagens, a fim de buscar os sentidos. Algo intuitivo, um carinho!

A cada página, Aline nos presenteia com alguns animais e um texto que dispara pistas do que nossos olhos devem encontrar. Tem um pinguim atrasado, um cachorro distraído que não sabe onde está o osso e até mesmo uma mamãe gata que fingiu não ver a bagunça de seus filhotes.

A sonoridade das palavras, as repetições, a gramatura do papel e as pontas arredondadas também são elementos interessantes nesta obra, que abraça de forma muito especial a primeiríssima infância. Uma paleta de cores nada estereotipada convida o leitor às mais variadas construções de sentidos.

Não poderia deixar de falar das várias camadas que este livro traz. Enquanto o leitor, seguindo as pistas desde o título, busca localizar os animais em cada dupla de páginas, fileiras de formigas costuram as páginas, quase numa narrativa só delas.

E quando você pensa que terminou… Opa! Logo vem uma surpresa para o leitor.

Um livro delicioso de ler sozinho, em família, provocando situações de afeto e ludicidade.

Menininho, de Gabriela Romeu (Panda Books)

Um convite ao carinho entre leitor e livro já se manifesta desde a capa, provocada pelo projeto gráfico repleto de sutilezas, com texturas e movimentos quase que despercebidos. Sabe aquela vontade de passar as mãos e abraçar um livro?!

A delicadeza da narrativa textual e visual seguirá como uma dança por toda a história que nos conta as aventuras deste menininho em seu quintal, mas que poderia ser qualquer quintal, até o seu, imerso nas brincadeiras sendo convidado a todo momento pela natureza a realizar as mais variadas peraltagens. Não tem como não lembrar de Manoel de Barros quando lemos seus poemas em total conexão com a natureza.

O galho que acolhe o ninho de passarinho, o ninho de raízes de mangueira que abraça a criança e toda sua imaginação quase que saltam à obra numa provocação que convida o leitor a brincar.

Esta história é carregada de possibilidades para as mais variadas formas de construção de significados a partir das experiências com leitura e das brincadeiras tão bem trazidas pela talentosa autora e pesquisadora da infância, Gabriela Romeu e as imagens tão delicadas de Elisa Carareto.
São muitos “não-ditos” nesta obra. Espaços e silêncios que cada leitor, movido pelo seu repertório cultural, literário e de infância, preencherão em seu tempo.

E tem um presente especial da autora para os leitores. Uma carta contando mais detalhes da inspiração para esta obra. E claro, uma sequência informática de algumas aves como João de Barro, João-Graveto e ainda um passo a passo para vocês construírem, em família carrinhos cheios de imaginação como o que conhecemos do menininho desta história.